Além de ter sido infectado pelo HIV, Timothy Ray Brown, de 44 anos, um americano que vive em Berlim, sofria de leucemia, um câncer que faz com que a medula óssea produza um grande número de células anormais do sangue.
Um dos tratamentos contra a doença é o transplante de células-tronco retiradas da medula do doador para o paciente – essas células podem se multiplicar e formar uma nova medula.
O que os pesquisadores da Universidade de Medicina de Berlim fizeram foi juntar condições favoráveis para o caso de Brown. A primeira é que, por questões genéticas, o paciente tem dificuldade na produção de uma proteína chamada CCR5, um receptor presente nos linfócitos CD4+, células de defesa do organismo que são destruídas pelo HIV. O vírus da Aids usa o CCR5 para se “encaixar” nessas células.
Os médicos, então, escolheram um doador de medula óssea que absolutamente não produz os CCR5 – pessoas com essa característica genética em geral são imunes ao HIV. Isso aconteceu em 2007. Depois de 13 meses, a leucemia voltou para o corpo do paciente, que foi submetido a um novo transplante com células do mesmo doador. Com os transplantes, o vírus da Aids desapareceu do corpo do paciente.
Quando o procedimento foi realizado, a expectativa era de que o HIV voltasse a ser detectado à medida que o sistema imunológico (responsável pelo combate do corpo a infecções) se normalizasse – o tratamento contra leucemia afeta essa defesa do corpo.
Entretanto, mais de três anos depois do primeiro transplante e vários meses após o fim do tratamento contra o câncer, o nível de linfócitos CD4+ no paciente está normal e não há sinal do vírus.
Em um estudo divulgado na revista científica Blood, os pesquisadores dizem que os resultados “sugerem fortemente que o paciente foi curado”.
Apesar da boa notícia, o procedimento não pode ser aplicado a todo mundo, diz Ricardo Sobhie Diaz, infectologista da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). O primeiro motivo é que as condições para o tratamento de Brown eram especiais: ele estava com leucemia, já teria de passar por um transplante de medula e produzia menos receptores CCR5. O médico diz que se trata de algo arriscado.
– A mortalidade após um transplante de medula é muito alta. O paciente provavelmente não iria morrer pelo HIV, porque hoje há um tratamento efetivo contra ele, mas poderia morrer por causa da intervenção, do transplante para curar o vírus.
Mas o médico reconhece que o experimento serve como um conceito que poderá ser explorado pelos cientistas na busca pela cura da doença.
– Talvez possamos tentar nocautear os receptores nas células, mas isso não seria feito por meio de transplante.